sexta-feira, 11 de novembro de 2011

INJUSTIÇAS FISCAIS VERSUS CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA !

O que nos diz o artigo 104º da CRP:
  
A nossa Constituição revela preocupações de equidade fiscal, justiça fiscal e de justiça social, no que aos impostos diz respeito. Assim o explicita o artº. 104º:

1-         O imposto sobre o rendimento pessoal (IRS) visa a diminuição das desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar.

2-          A tributação das empresas (IRC) incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real.

3-       A tributação do património ceve contribuir para a igualdade entre os cidadãos.

4-          A  tributação do consumo (IVA) visa adaptar a estrutura do consumo à evolução das necessidades  do desenvolvimento económico e da justiça social, devendo onerar os consumos de luxo.

I – A criação da riqueza nacional

Como sabemos há duas classes sociais envolvidas directamente na criação da riqueza nacional: os empresários e os trabalhadores.

Tanto uns como outros são cidadãos do nosso país, e também são consumidores.

Os empresários reúnem o capital social necessário, quer com recursos próprios, quer através de financiamento, para a formação das empresas em geral. É óbvio que os empresários, (ou donos do investimento, ou donos da empresa, ou patrões), têm a expectativa de que com esse negócio, vão ter acesso a um lucro, o qual incluirá um prémio de risco inerente a todo o investimento.

Os trabalhadores, por seu lado são recrutados pelos empresários, e são fundamentais para transformarem as matérias primas e outros materiais, nos produtos finais. Por esse trabalho, ganham um salário, o qual é estipulado pelo mercado da oferta e procura (se há muitos trabalhadores desempregados ou candidatos ao trabalho em questão, o salário tenderá a ser baixo e vice-versa).

Os salários (as despesas com pessoal) são um custo de produção para o empresário, tal como o são os combustíveis, a electricidade, etc etc.. Por isso quanto mais elevados forem os salários (ou os combustíveis, ou a electricidade, ...) menor tenderá a ser o lucro obtido pelo empresário, ou seja há interesses opostos: o empresário tem interesse em pagar um salário o mais baixo possível, e o trabalhador pelo contrário, quer um salário que dê para pagar a habitação, a alimentação, a saúde e a educação, da sua família.

O Código das Sociedades Comerciais, determina que o Empresário (o accionista, o sócio-gerente,  ...) tem direito ao Lucro que a empresa conseguir apurar. O trabalhador é um credor para a empresa: tem direito a receber o salário e as indemnizações ao mesmo inerentes.

Por seu lado os Governos,  legitimamente eleitos em eleições livres e democráticas, vão gerir os interesses gerais da sociedade, e para  conseguir cumprir as suas obrigações, os Governos (para além de receitas próprias ligadas às empresas públicas) vão ter de lançar mão dos impostos, com base no poder de soberania que lhe foi outorgado através da CRP e da Assembleia da república, e respeitando o explicitado pela CRP (artº 104º).


II – A situação actual relativamente ao IRS e IVA

Sobre o rendimento dos trabalhadores incide o IRS, o qual permite algumas deduções, cada vez menores. O Justo seria que os encargos com a habitação, com a alimentação, com a saúde e com a educação, fossem deduzidos. Mas como os salários mal dão para as despesas, o Governo dessa forma não teria imposto, e por isso o IRS incide sobre o rendimento, faz de conta que deduz alguma coisa, e zás catrapás, venha daí o imposto, ou vai tudo penhorado.

Os trabalhadores que ganham pouco, com pouco ficam, os trabalhadores que ganham um pouco mais, ficam aflitos pois querem educar os filhos e ter uma habitação digna. Claro que os trabalhadores que ganham muito bem (por exemplo os gestores ligados aos partidos políticos), assobiam para o lado, pois o imposto não lhes faz mossa à vida de luxo que continuarão a ter.

Como se não bastasse o IRS para lhes pôr a cabeça à roda, o Governo ainda lhes impõe o IVA! Ou seja o trabalhador paga o IRS, leva uns trocos para casa, e quando vai comprar comida, papel higiénico, cozinhar, tomar banho, ..., tem de pagar mais uns dinheiros ao Governo!!! FICA SEM UM EURO no fim do mês! Exceptuando claro os ditos gestores que ganham vencimentos milionários, e ainda conseguem prémios de alguns milhões de euros !

E nem seria preciso dizer, mas os empresários (os sócios, os accionistas) que ficam com os lucros, também são cidadãos e também pagam o IVA. Alguns deles até se dizem trabalhadores (ou seja para além do lucro, e uma vez que exercem funções concretas nas suas empresas, estipulam um salário à sua escolha para receberem! Claro que o IVA não faz mossa aos empresários, pois estes, tal como os deputados, estipulam o seu próprio salário, e quem aguenta com o IVA é mesmo e só, o consumidor final.


III – O caso do IRC -imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (empresas).

Chama-se de imposto sobre o rendimento, e a CRP até diz no nº 2 do artº 104, que é um imposto sobre o rendimento real das empresas, mas de facto, é um imposto que incide só, e caso exista, sobre o LUCRO.

Os lucros são "animais escorregadios", e as empresas contratam técnicos contabilistas que sabem o que é a Contabilidade Criativa e o que é o planeamento fiscal, e os LUCROS somem como que por magia! Resultado, só apenas cerca de 5% do total das empresas portuguesas pagam IRC!

Estamos então perante uma flagrante injustiça fiscal, e ainda por cima, como o Governo necessita de dinheiro, vai ainda sobrecarregar mais os impostos sobre quem trabalha (+ IRS) e os impostos sobre quem consome (+IVA).

Essa prática, distorce a repartição da riqueza nacional, e prejudica o dinamismo da economia, pois ao haver menos rendimento disponível nas mãos dos consumidores que menos ganham (e que têm maior propensão ao consumo, pois o seu rendimento é tão pequeno que desaparece num ápice) então as compras diminuem, e logo as empresas têm de produzir menos, se não querem ficar com stocks em excesso.

Então como realizar a justiça social e fiscal?

Tal desiderato exige vontade política: cumprir o estipulado no artº 104  da CRP, ou seja fazer incidir o IRC sobre o RENDIMENTO REAL das empresas. Isto é, em vez de como está acontecendo, ( derivado das pressões  dos lobbies empresariais junto dos governos) o IRC incidir sobre o lucro,   fazer, como o determina a CRP, incidir sobre o Rendimento das empresas (como aliás é feito em relação aos trabalhadores e empresários individuais).

Mas isso seria a ruína das empresas, dirão de imediato os empresários aflitos! Não, meus senhores, o que aconteceria é que TODAS AS EMPRESAS passariam a pagar imposto (como acontece por exemplo em Espanha), só que o imposto seria menor.

Como todas as empresas pagariam um IRC incidente sobre a sua facturação, a taxa de IRC seria a adequada (tipo 1 por mil sobre a facturação) por forma a que o imposto fosse menor para todas as empresas, não sobrecarregando os 5% de empresas que cumprem, nem sobrecarregando o IRS e o IVA como vem acontecendo, em prejuízo da economia, dos trabalhadores e dos consumidores.

Só o PAN (www.partidoanimaisnatureza.com)  mostrou vontade política de corrigir as injustiças fiscais derivadas do incumprimento da CRP, em relação à tributação das empresas.

Ao invés de apenas 5% das empresas pagarem IRC, o PAN defendeu nas suas propostas eleitorais que todas as empresas pagassem um IRC incidente sobre a sua facturação, mas um imposto que seria calculado com base numa taxa de IRC baixa e apropriada. Dessa forma seria corrigida a flagrante injustiça fiscal que reina actualmente, e que sobrecarrega com impostos quem trabalha e quem consome, mas deixa de fora cerca de 95% das empresas, o que além do mais, se traduz no incumprimento do artº 104º da CRP.

Torna-se aliás incompreensível para muitos trabalhadores, que as suas empresas apresentem sempre lucro próximo do zero, enquanto os respectivos donos das mesmas constroiem luxuosas vivendas, compram quintas,  jipes de luxo, etc.. Por isso, cada vez se torma mais fundamental que os trabalhadores das empresas tenham direito ao acesso à informação económico-financeira  das suas empresas.


IV – O caso dos impostos sobre o património

Parece haver nos dias de hoje maior receptividade ao que é exigido pela CRP, não no sentido da maior igualdade entre os cidadãos, mas no sentido de os “grandes patrimónios”  (as grandes fortunas) deverem ser tributados, de tal forma que se torne visível o esforço dos mais ricos (são sempre uma minoria de famílias, e geralmente detêm a maioria da riqueza do país!) na ajuda concreta à correcção do défice orçamental do país.

Parece-nos que o Sr.  Presidente da República foi sensato, ao focar a necessidade de taxar adequadamente as “Heranças”, e as “Doações”. Tanto as heranças, como as doações, não se traduzem em rendimentos derivados de criação de riqueza adicional, ou seja do trabalho (os quais já são fortemente taxados em sede de IRS), por isso seria um caminho a explorar no prosseguimento da equidade e da justiça fiscal, tal como preconizado pela CRP.

Mais importante que pretender taxar as grandes fortunas, ou os grandes rendimentos (os quais já são fortemente taxados em sede de IRS), seria a nosso ver  mais razoável,  estender a indidência do imposto  às operações financeiras especulativas ,  e é mais que evidente que a UE tem de tomar uma posição conjunta coordenada, mas urgente  com os EUA, quanto ao fim dos escandalosos OFF-SHORES.


V - Conclusão: 

Na sua ânsia de realizar receitas, forçadas pelo despesismo e pelo desperdício dos dinheiros públicos, os Governos não têm respeitado nem o nº 1 do artº 104º da CRP (o IRS não tem tido em conta as necessidades do agregado familiar), nem o nº 4 do artº 104º  (o IVA não tem respeitado nem as necessidades do desenvolvimento económico, nem a justiça social, e tem onerado os bens de 1ª necessidade, como é o caso recente do gás e da electricidade).

Sem uma regulamentação financeira forte, que imponha disciplina no mercado financeiro não bancário (o qual está regulado pelos bancos centrais) torna-se difícil taxar adequadamente  as operações financeiras especulativas, e não será possível continuarmos a falar de equidade e de justiça fiscal, enquanto 95% das empresas conseguirem eximir-se ao pagamento de IRC (o qual de facto deve incidir sobre a facturação das mesmas, por forma a que todas paguem um imposto baixo mas justo, tal como exigido pela CRP), e enquanto não forem eliminados todos os OFF-SHORES, seja na UE seja fora dela. 
  
Por outro lado, tarda a harmonização fiscal no seio da UE, a qual no entanto se tornará viável, se avançar, como é desejávl e inadiável, a constituição dos Estados Unidos da Europa, com a consequente formação de um Governo Europeu, e a tomada de medidas de coesão económico-sociais, previstas nos tratados, mas nunca aplicadas de forma coerente, porque cada Estado Membro apenas se tem orientado pelos seus interesses egocêntricos, em detrimento da união política e económica da UE.  

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